Faculdade pede fim de gritos de guerra preconceituosos em competições

Sabine Righetti

Quem já participou, no Brasil, de alguma competição esportiva entre universidades sabe: além das tradicionais baterias, o que se ouve são gritos de guerra quase sempre preconceituosos. Funciona assim: a torcida encontra um alvo no time adversário –que, em geral, não tem nada a ver esporte– e entona canções destacando defeitos desse time. A beleza das mulheres, por exemplo, é um dos alvos preferidos.

Pois neste ano, a FGV (Fundação Getúlio Vargas), tradicional escola de administração do país, tentou conscientizar os seus alunos sobre os gritos de guerra preconceituosos durante a “Economíadas”, competição que reúne mais de 5.000 estudantes de administração e de economia uma vez por ano.

Primeiro, a coordenação de cursos da escola fez uma reunião com entidades representantes de estudantes para discutir o assunto. Em seguida, enviou um e-mail aos alunos pedindo “atuação responsável da Atlética e demais organizações estudantis: “Essa atuação [responsável] não se caracteriza por entoar hinos e cânticos que sejam depreciativos a grupos quaisquer no contexto de direitos humanos e diversidade”, descreve o comunicado ao qual o Abecedário teve acesso.

Entre os “cânticos depreciativos” mencionados na carta estão os hinos que comumente chamam as alunas da FEA-USP, principal rival esportiva e acadêmica da FGV, de “barangas” ou de “vagabundas”. A recíproca também acontece: “Ah, quero beber, quero cheirar / Cuidado, baranguinhas da gv / Porque, a TOFU [sigla para “Torcida Organizada da FEA-USP] vai te pegar”.

‘PARAR PRA DÁ PORRADA’

TOFU também levanta hinos que incitam violência (“Viemos de São Paulo / E muitas vezes tivemos que parar / Parar, parar, parar pra dá porrada / Dá porrada na gv”). Outros zombam do fato de que os estudantes de escolas particulares têm de pagar mensalidades:

“PUC, Mackenzie, gv
Fuvest acabou com você
Estudo na faixa
Cê paga carnê
Cê tá acostumado a perde”

No vídeo abaixo, publicado no YouTube dias antes do início das Economíadas, o hino destaca, por exemplo, que uma aluna da ESPM terá de se prostituir para pagar as contas. Em outra parte, uma alusão ao caso da Suzane Richtofen, que cursava PUC-SP quando participou do assassinato dos pais em 2002: “eu vou chamar o meu namorado para me defender” (voz de mulher) / “ele vai dar uma assassinada na família dela” (voz de homem).

Até o momento, os resultados da ação isolada da FGV ainda são duvidosos. O Abecedário conversou com alguns alunos que participaram da Economíadas neste feriado de Tiradentes, que não quiseram se identificar, e eles foram unânimes: os gritos de guerra preconceituosos estavam lá. “Não adianta uma escola tentar conscientizar seus alunos. Seria interessante se mais escolas fizessem isso e que as atléticas também conversassem antes dos jogos”, disse um aluno que participou da competição.

Neste ano, a Economíadas aconteceu em Americana, cidade a 125 km da capital São Paulo. Os organizadores estimam que o evento renda cerca de R$ 2 milhões a cada ano para a cidade-sede. As escolas vencedoras em cada esporte podem ser acompanhadas na página do evento no Facebook.